Dra. Christina Bloem
A medicina de emergência moderna tem raízes que começam na primeira guerra mundial. Médicos militares reconheceram que a rapidez e a ordem do atendimento de soldados feridos tiveram grande impacto na sobrevivência e assim foram desenvolvidos sistemas de triagem e o conceito de atendimento de emergência1. Posteriormente, esse sistema foi adotado dentro da medicina civil, com o desenvolvimento de ambulâncias e do sistema pré-hospitalar.
Ao longo da história, a medicina foi dividindo-se em especialidades cada vez mais específicas. Foi nesse contexto que surgiu a medicina de emergência. As sociedades médicas, assim como o público, foram reconhecendo a importância de serem atendidos por profissionais educados e treinados especificamente para atendimento de patologias graves1.
Na década de 1960, começou o movimento da criação da medicina de emergência como especialidade médica. Países como Estados Unidos e Inglaterra formaram associações médicas de emergência e começaram a desenvolver cursos e residências para a formação de profissionais que atuavam na área. Com isso, a base de médicos emergencistas foi crescendo, houve a criação de periódicos e o apoio aumentou cada vez mais para o desenvolvimento da especialidade1.
Em alguns países, a aprovação da especialidade rapidamente tornou-se realidade e logo foi desenvolvido um processo de certificação dos especialistas por meio de exames e critérios mínimos de educação e experiência de trabalho. O processo de desenvolvimento da medicina de emergência progrediu de forma semelhante em todo o mundo. O grupo de médicos interessados em emergências originou-se a partir da clínica médica em Taiwan2, da anestesiologia na França3, da cirurgia no Japão4, da medicina de família no Canadá5 e na Jordânia6, ou simplesmente daqueles que trabalhavam nos departamentos de emergência. Hoje, existem mais de 48 países no mundo onde a especialidade é reconhecida e vários outros em desenvolvimento, onde existem programas de formação específica em medicina de emergência7.
O Brasil reconheceu a especialidade em 2015, depois de muitos anos criando uma base forte de emergencistas que lutaram para atingir essa meta de uma formação adequada e um atendimento de alto padrão para pacientes com emergências. A Faculdade de Medicina da USP criou a disciplina de Emergências Clínicas em 1992. A primeira residência em medicina de emergência no Brasil foi estabelecida em Porto Alegre-RS em 1996. Apesar de ser criada antes do reconhecimento formal da especialidade, essa residência serviu para formar líderes no movimento da medicina de emergência e criou um forte perfil do emergencista. Em Porto Alegre, médicos formados na emergência eram procurados por hospitais locais, reconhecendo a formação diferenciada que tinham. A Associação Brasileira de Medicina de Emergência formou-se em torno de 2008, uma gema de várias associações de medicina de emergência regionais que a precederam. A segunda residência foi estabelecida em 2008 em Fortaleza-CE, e trouxe a especialidade para o norte do país. Hoje, existem mais de 40 centros formadores de emergencistas por todo o país8.
Recentemente, órgãos de grande porte, como a Organização Mundial da Saúde (OMS) tem apoiado o estabelecimento de padrões internacionais para o atendimento às emergências9. Subespecialidades e áreas de concentração, como simulação, ultrassom, medicina de emergência pediátrica e outras continuam aumentando dentro da medicina de emergência. Graças à informatização do mundo de hoje, parcerias internacionais e transferência de conhecimento são mais fáceis e contribuem no acesso à formação e no apoio ao desenvolvimento da especialidade em países por todo o mundo. A pandemia do COVID ressaltou a importância dessa formação, sendo que emergencistas servem como linha de frente e tem um papel chave no reconhecimento e no atendimento adequado em desastres, eventos de múltiplas vítimas e pandemias. Estamos vivendo um momento grande de nossa história da medicina e temos a oportunidade de crescer através disso, de concretizar sistemas de atendimento às emergências de alta qualidade para proteger a saúde de nossas comunidades.
REFERENCES
1. Suter, RE. Emergency medicine in the United States: a systemic review. World J Emerg Med. 2012; 3(1): 5–10.
2. Bullard MJ, Liaw SJ, Chen JC. Emergency medicine development in Taiwan. Ann Emerg Med 1996; 28: 542-7.
3. Nikkanen HE, Puges C, Jacobs LM. Emergency medicine in France. Ann Emerg Med 1998; 31: 116-20.
4. Ezaki T, Hashizume M. Emergency medicine in Japan. A look at a current university hospital and the problems faced. Emerg Med Australas 2007; 19(4): 296-9.
5. Beveridge RC. Emergency medicine: a Canadian perspective. Ann Emerg Med 1995; 26: 504-7.
6. Abbadi S, Abdallah AK, Holliman CJ. Emergency medicine in Jordan. Ann Emerg Med 1997; 30: 319-21. 2.
7. Member Organizations of the International Federation of Emergency Medicine. Disponível em: https://www.ifem.cc/membership/member-organisations/.
8. A Medicina de Emergência no Brasil. Disponível em: https://abramede.com.br/a-medicina-de-emergencia-no-brasil/.
9. Mock C, Arafat R, Chadbunchachai W, Joshipura M, Goosen J. What World Health Assembly Resolution 60.22 means to those who care for the injured. World J Surg. 2008 Aug;32(8):1636-42.