Weverson de Abreu Lima
RELATO DE CASO
Trata-se de uma paciente de 65 anos, sexo feminino, admitida em uma Unidade de Pronto-Atendimento (UPA 24h) de Fortaleza-CE por quadro de pielonefrite. A paciente já tinha uma doença renal crônica, mas sem terapia dialítica até então. Durante sua permanência na unidade, necessitou realizar hemodiálise programada, com necessidade de implante de cateter duplo-lúmen para realizar suas sessões.
De acordo com o relatado no prontuário e pela equipe de enfermagem, houve dificuldade na punção da veia femoral direita, sendo o cateter implantado em veia jugular interna esquerda também com dificuldade. Iniciou então suas sessões de hemodiálise. Porém, evidenciado que catéter apresentava baixo fluxo, sem melhora com manobras de reposicionamento. Além disso, paciente passou a apresentar sangramento leve a moderado pelo orifício de punção do cateter em região cervical esquerda.
Dois dias após o referindo procedimento e tais relatos, assumi o plantão e, ao avaliar a paciente, a mesma ainda apresentava sangramento pelo orifício de punção do cateter. Além disso, apresentava leve dor e edema em membro inferior direito, no qual havia sido tentado realizar punção de cateter de hemodiálise dois dias antes.
Com auxílio de aparelho de Ultrassonografia portátil, decidi por fazer uma varredura nos principais vasos cervicais e de membros inferiores, pois havia necessidade de troca de cateter para prosseguir com as sessões de hemodiálise da paciente. No caso da paciente, havia o relato de dificuldade de punções anteriores, além de dor e edema em membro inferior direito e sangramento no orifício de punção associado a baixo fluxo no cateter da veia jugular interna esquerda. Inicialmente, avaliei os vasos inguinofemorais da paciente. À esquerda, em todo o trajeto para possíveis punções, a artéria estava por cima da veia, o que dificultaria sua punção “às cegas”. Veias femorais comum e superficial e veia poplítea esquerdas apresentavam bom fluxo ao doppler em cores e com boa compressibilidade, não denotando sinais de trombos na região. Ao avaliar os vasos inguinofemorais à direita, local de tentativas prévias de punção vascular, foi evidenciado que o lúmen venoso apresentava conteúdo heterogêneo, hiperecoico, além de fluxo prejudicado visualizado no doppler em cores, denotando sinais de trombose venosa naquele sítio.
Por maior probabilidade prevista de haver dificuldade de punção em veia femoral esquerda pela disposição anatômica, pela contraindicação pela presença de trombo em veias femorais direitas e pela presença de cateter prévio em veia jugular interna esquerda, restavam os vasos subclávios e a veia jugular interna direita. Pela maior superficialidade dos vasos e menor risco de acidentes relacionados ao procedimento, avaliado veia jugular interna direita e percebido vaso com bom calibre, superficial e com bom fluxo ao doppler em cores. Realizada punção de veia jugular interna direita guiado por ultrassonografia pela técnica oblíqua. Realizado implante de novo cateter de hemodiálise neste sítio sem intercorrências. Retirado cateter prévio em veia jugular interna esquerda e visualizado trombo em seu lúmen. Feito compressão local e curativo com parada do sangramento referido.
Com auxílio diagnóstico da ultrassonografia a beira leito, foi possível uma tomada de decisão mais rápida quanto ao manejo da trombose venosa, sendo iniciado seu tratamento com anticoagulação parenteral e posterior transição para oral. Como a paciente ainda ficou mais alguns dias na unidade aguardando leito hospitalar, percebeu-se melhora e posterior resolução dos sintomas de dor e edema no membro inferior direito, além de evoluir sem novas intercorrências até sua transferência para uma unidade hospitalar para dar seguimento ao seu tratamento.
DISCUSSÃO
A Unidade de Pronto Atendimento (UPA 24h) é um dos componentes da Rede de Atenção às Urgências. A implantação deste Programa, em 2008, é uma das estratégias do Ministério da Saúde para reorganizar, qualificar e fortalecer a Rede de Atenção às Urgências e Emergências no País. O objetivo é concentrar os atendimentos de saúde de complexidade intermediária, compondo uma rede organizada em conjunto com a atenção básica, atenção hospitalar, atenção domiciliar e o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência - SAMU 1921
Caso haja indicação de permanecer internado, a equipe das UPAs solicita a transferência via centrais de regulação de leitos. No entanto, muitos pacientes, por falta de leitos imediatamente disponíveis na rede hospitalar, acabam ficando mais tempo sob os cuidados da equipe das UPAs24h
Como exames de imagem disponíveis, as UPAs possuem apenas radiografia, com aparelho fixo, não podendo ser deslocado em direção aos pacientes mais graves caso seja necessário. Desse modo, percebemos que a disponibilidade e um aparelho de ultrassonografia que pode ser levado ao paciente para exame a beira leito pode ser fundamental, principalmente para tomada de decisão em pacientes mais críticos.
São várias as aplicações da ultrassonografia na emergência. Seu uso tem contribuído para qualificar a assistência ao paciente, especialmente quanto a segurança de procedimentos, precisão diagnóstica e redução de custos. A ultrassonografia a beira leito pode responder questionamentos importante em menor tempo e com menos custos que o métodos de imagem avançados. Além disso, é um exame que pode ser repetido quantas vezes forem necessárias, possibilitando uma avaliação dinâmica do paciente ².
No caso relatado, percebeu-se a importância da disponibilidade do Ultrassografia a beira leito na tomada de decisão. Facilitou o diagnóstico de trombose venosa profunda, possibilitando início imediato de seu tratamento, e facilitou a punção de um novo catéter de hemodiálise para dar seguimento ao tratamento da paciente de forma rápida e sem intercorrências.
REFERÊNCIAS
1. Ministério da Saúde. Portaria nº 1.601, de 7 de julho de 2011. Estabelece diretrizes para a implantação do componente Unidades de Pronto-atendimento (UPA 24h) e o conjunto de serviços de urgência 24 horas da Rede de Atenção às Urgências, em conformidade com a Política Nacional de Atenção às Urgências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 08 jul. 2011b. p. 70.
2. Ultrasound Guidelines: Emergency, Point-of-Care and Clinical Ultrasound Guidelines in Medicine. Annals of Emergency Medicine 2017 , Volume 69 , Issue 5 , e27 – e54.